sábado, 28 de abril de 2012

Única

Mã (como eu chamo a minha mãe), hoje, estou me sentindo muito oca. 
Ontem, fez um mês que o Kokão se foi. Hoje, faz dois anos que você fez a viagem.
O que deu em vocês, para nos deixar assim, ainda com tanto a fazer por mim, meus irmãos e seus netos?
Sabe o que mais sinto pela sua partida? Não poder lhe contar as coisas! 
A gente tinha tantas diferenças, mas você é a única pessoa que eu conheço, a quem eu confiaria o meu segredo mais tenebroso, porque não conheço ninguém capaz de guardar algo que lhe seja confiado, como você!
Às vezes, me pego olhando para a sua fotografia, e lembro com muita saudade, das conversas que tínhamos, onde fosse o que fosse que eu lhe contasse, você nunca julgava. Só ouvia...
Claro que você também era (será que ainda é?) muito "tagarela" (risos); Arranjou um jeito de falar até mesmo quando os médicos garantiram, que traqueostomizada, isso seria impossível! (Risos...) Mas qualquer que fosse o assunto, você jamais trazia à tona, aquilo que lhe fosse dito em segredo. 
Sempre disse às pessoas que nos conheciam (e até para aquelas só do meu convívio, que para guardar um segredo, você era (é) única!
Mã, sinto a sua falta, mais do que posso administrar, sabia?
Queria lhe dizer, que finalmente, consegui mandar forrar aquele sofá; Que a Anastácia, ficou ótima após a retirada dos tumores que tinha nas mamas, mas justo a "gorda", ficou ainda mais roliça; Que a Belizária, emagreceu muito quando ficou doente, mas está melhorzinha, e continua, como você dizia, abrindo os olhinhos pela manhã, já avaliando as possibilidades da arte do dia; Que o Antonio, é um "grude" com a vovó, e que o Marcus, ri à larga, quando me vê repetindo as suas façanhas, na condição de avó, e que a Cláudia, é uma nora especial, no que tenho certeza, você concordaria...
Seriam tantas as novidades, nesses dois anos, que a gente ficaria horas sentadas naquela cozinha, lambiscando e conversando... é muito grande a saudade, minha mãe!
E também, tem a partida do Kokão, que se for assim, deve estar ao seu lado, e agora, vocês dois, mais uma vez, entabulando planos, para os filhos e netos, como sempre faziam juntos... acho que a chegada dele ai, deve tê-la deixado com o coração apaziguado, né?
O tempo, acomoda os sentimentos de dor pela perda, mas não diminui a saudade. Antes, só a faz aumentar...
Sem você, o silêncio é algo denso e, a falta que sinto do som da sua voz, nem eu mesma posso dimensionar...
É enorme a lacuna do vazio que você me legou, Mã, mas se puder e estiver vendo o meu coração, por favor, não deixe de abrandar o tumulto que está ali instalado, porque tá difícil, sabia?

Com muito amor e muita saudade, sua filha.

Bom dia!

 
 

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Missiva

Meu querido "Kokão", faz um mês que nos despedimos (aliás, eu me despedi de você).
A saudade é enorme, mesmo por tão pouco tempo de afastamento...
Tempo? O que dizer desse ditador, que enquanto conforta, trata das feridas, também me acorrenta e mantém refém de seus caprichos?
Você se foi, sem dizer adeus, porque saiu durante a chuva, em meio à tempestade de raios e trovões, como se tivesse medo da despedida.
Eu estava lá, mas você fez questão de não olhar pra mim. Fui para estar com você, mas como estava determinado, continuou naquele sono do qual não mais acordou.
Lhe abracei, segurei a sua mão, lhe sussurrei o meu amor, a minha gratidão, mas você manteve o silêncio.
Papai, a minha dor, era maior que a sua, pois era eu quem ficava, enquanto você buscava novos horizontes (quem sabe, encontrar com a mamãe), me deixando ali, sem poder fazer escolhas e, ademais, você estava sedado, eu não.
Afirmou a sua história, nas minhas lágrimas, permitindo que eu me sentisse assim, desamparada.
Não pude me redimir; Não pude agradecer; Não pude contar meus segredos... e você, não me contará mais os seus...
Kokão, éramos tão amigos... ou somos?
Naquela hora, só conseguia pensar que você precisava ir e por isso, não pedi para que ficasse, mas se estava me vendo, sabia que a minha vontade era gritar que não fosse.
Eu ainda preciso tanto de você! Não sei andar sozinha! Você foi sempre tão presente, que se esqueceu de me dizer como seria.
Aliás, Kokão, também não cumpriu a sua promessa: disse que viveria até os 112 anos!
Me fez acreditar que tinha o poder de determinar quando fosse a hora de partir... hoje, concluo que você também não sabia.
Na memória, guardo o seu sorriso, o azul dos seus olhos, a lembrança das suas mãos, sempre trêmulas, mas que transmitiam a segurança que ninguém jamais será capaz de me dar.
Lembro o som da sua voz, e às vezes, ainda ouço você me chamar. Que loucura! Sei que não está mais comigo, mas não posso pensar que seja assim... afinal, você me disse que a vida continua!
Sempre acreditei que você seria eterno! Que tola!
Sinto muito a sua falta, que me remete aos ensinamentos que me deu, ao seu afeto paterno, e não me permito sentir a sua ausência. Você continua...
Agora, me restam as lembranças, a saudade que fere diariamente, impedindo que a dor esmoreça, o aprendizado que foi viver sob a sua proteção e o seu amor.
Sinto que todo o meu amor por você, não justifica o quanto devo lhe agradecer.
Quando puder, e se puder, me responde essa carta. Mesmo não acreditando que aconteça, em algum cantinho escondido no meu coração, estarei pensando que um dia, vou receber notícias suas e você vai me provar que isso não é fantasia, que é possível, até porque, preciso acreditar.
Com amor, sua filha, sempre...

Boa tarde!

  

domingo, 22 de abril de 2012

Risco

Percebo que você está apostando na vida eterna...
Será que ela existe? E será que nós estaremos nela, juntos?
Está tão preocupado em fazer tudo ao mesmo tempo, e para tanta gente, que está se esquecendo de nós!
Está deixando o tempo (que não temos), nos distanciar sistematicamente.
Não confio nas suas promessas, não acredito em você!
Não vislumbro futuro e vou ficando, indiferente, aos seus passos que agora, se na minha direção, ou em sentido contrário, sinceramente? Acho que já não faz diferença!
Acolho você no coração, meio que pelo hábito da janela aberta e esquecida...
Espio você pela fresta, mas se não o vejo, também não perco o fôlego, não fico mais ansiosa...
Você nunca se dá conta das perdas que amealhou durante a sua vida inteira e até pode ser por insegurança, ou medo de ser feliz, mas o fato é que está acostumado a não entender o mal que faz a si mesmo.
Outrora, eu corria na sua direção, buscava você. Hoje, cobro apenas a presença, sem fazer questão do conteúdo; Também não se dá conta disto.
Todos os dias, quando me acorda, eu penso se faz sentido... todos os dias, quando vou dormir, me pergunto se amanhã será diferente...
Não vejo como mudar o sentido da roda que nos move,  pois já estabeleceu o círculo vicioso...
Sei que posso dar um basta, mas você esgotou minhas forças de tal modo, que tenho preguiça de fazer o que devo. Espero...
Vez ou outra, acho graça nas suas tentativas de justificar suas faltas, mas na verdade, nada mais me faz rir como antes...
Você vem secando a força vital de "nós", sem calcular o risco. Tem apostado que será pra sempre, mas eu não creio mais que seja possível, então, só vai ficar mais difícil, com o passar do tempo.
Observa seus passos e reavalie nossos papéis. Tenho certeza que meu contrato de amor eterno, já se expirou, e quem o rescindiu, foi você, por descumprimento de cláusulas que jamais poderiam ser violadas.

Bom dia!!!

 

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Abandono

Não me desampara, por favor!
Esteja onde estiver, olha por mim. 
A dor da minha saudade, só não é maior que a minha insegurança. Tenho medo de seguir sozinha, sem suas mãos a me guiar, sem seus conselhos, sem sua proteção.
Se não podia de outro jeito, devia ter me dito que ia doer tanto, mas não me preparou para conviver com a sua ausência.
Me fez acreditar que seria para sempre!
E o que eu faço agora?
Como administro esse vazio?
O seu olhar (que olhos lindos!), o seu sorriso, não estão mais aqui para me acolher...
Nunca mais a sua voz; Nunca mais a sua gargalhada; Pior: nunca mais o seu zelo e o seu carinho...
Só essa sensação de abandono, a perda que me asfixia.
Ouvir seus CD's, não ajuda, porque aumenta a saudade.
Fiquei à margem da estrada, sem vontade, sem coragem pra seguir em frente...
Por que teve que ir?
As lágrimas, até consigo a custo, estancar, mas sem você, não posso deixar de sentir dor.
Mesmo querendo, não sou assim tão desgarrada.
Eu tive infância. Escrevi a minha história, mas você estava nela.
Foi meu herói, meu campeão.
Ouvir sem você, as suas músicas favoritas, me demonstra que só aumenta a saudade e a dor da sua partida.
Meus ouvidos treinados pelo seu gosto musical, não ajudam a esquecer...
Sei que é a ordem natural da vida, e você tinha que ir, mas me sinto traída por sua debandada. 
Me fez acreditar que não partiria ainda e agora, me deixa órfã desse jeito...
Preciso seguir, porque a vida me exige, mas por favor, esteja onde estiver, cuida de mim!

Homenagem ao meu pai (Kokão), Bittencourt Bertulucci, que faleceu no dia 27 de março de 2012, aos 79 anos, escrita na estrada, em viagem de volta, após o seu sepultamento.

Bom dia!